Artistas e Obras
Profa. Dra. Regilene A. Sarzi-Ribeiro
Orientação e Curadoria
Pós-doutorado em Artes (IA / UNESP / SP). Doutor em Comunicação e Semiótica (PUC / SP). Professor permanente do Programa de Pós-Graduação em Mídia e Tecnologia (PPGMiT). Professor Doutor do Departamento de Artes e Representação Gráfica atuante nos cursos de Artes Visuais e Rádio TV e Internet da FAAC / UNESP. Líder do grupo de pesquisa LabIMAGEM – Laboratório de Estudos da Imagem / CNPq. Desenvolve pesquisas em videoarte, arte eletrônica, cinema ao vivo, imagem ao vivo, ativismo digital e curadoria ativista envolvendo a ecologia do vídeo, audiovisualização da cultura, audiovisualidades e tecnocultura nas redes sociais.
Contato: regilene.sarzi@unesp.br
IDORCID: https://orcid.org/0000-0001- 6267- 6549
Marcelo Bressanin
Artista convidado
Desde 2010, Marcelo Bressanin atua como artista conceitual e dedica suas pesquisas à arte sonora e a suas relações com outras linguagens e em diversos formatos. Entre 2013 e 2017 integrou o coletivo DUO b, com o qual realizou vários projetos. Participou dos programas de residência artística Em Residência: Bauru (Bauru, 2020), Organicidades (Franco da Rocha, 2019), Toda la teoria del universo (Chile, out/nov 2018), Soy loco por ti Juquery (São Paulo, junho/2018) e La Ira de Dios (Buenos Aires, 2018), Residência de Criação TSONAMI de Arte Sonora (Chile, nov/dez 2017) e Obras em construção (Casa das Caldeiras, São Paulo, 2015 e 2016). Atualmente participa do projeto Ler, Interpretar, Escrever, Sonorizar (em parceria com Paulo Sandrini) e da co-curadoria do projeto Entranhamentos (com o artista paulistano Jp Accacio), além um segundo mestrado no Programa de Pós-graduação em Mídia e Tecnologia (PPGMiT) na FAAC Unesp Bauru.
https://marcelobressanin.wordpress.com
“O rio sempre volta” (2021)
Escultura sonora (Estruturas de vergalhões de aço com bases de cimento e madeirite, mangueira sanfonada industrial, reservatório e bomba de água, piezos elétricos, amplificador e alto-falantes)
Dimensões: 5,0 m X 2,0m X 1,60m
A escultura sonora é composta por quatro colunas de vergalhões armadas sobre bases de madeirite e cimento e dispostas linearmente. A estrutura apoia uma mangueira sanfonada pela qual é bombeado um circuito fechado de água desde um reservatório, instalado na parte inferior da obra até sua parte mais elevada. Dez alto-falantes são espacializados nas colunas e ligados a um amplificador que recebe e potencializa os sinais sonoros captados por microfones piezos em contato com a água circulante no sistema.
A obra discute temas frequentes na produção do artista, como a transformação das paisagens e das memórias urbanas e a escuta, neste caso se referindo diretamente à canalização/desaparecimento do Ribeirão das Flores, atualmente enclausurado sob a Avenida Nações Unidas (Bauru, SP) e não mais presente na paisagem urbana do município.
“Deluxe 5”: dispositivo composicional randômico” (2021)
Escultura sonora (Aparelho de rádio/TV portátil, Arduíno Uno, motor de passo e alto-falantes)
Dimensões: 1,5 m X 1,5 m
A instalação sonora é composta por um aparelho de rádio/TV portátil acoplado a um sistema eletromecânico controlado digitalmente por um Arduíno e conectado a um sistema de amplificação e de reprodução (alto-falantes). Em seu funcionamento, a escultura produz uma peça sonora ininterrupta e variável a partir da sintonização das emissões de rádio captadas pelo sistema.
Trata-se, aqui, de potencializar a percepção de uma paisagem sonora mutante, composta aleatoriamente a partir de inúmeras transmissões radiofônicas que perpassam o cotidiano urbano da cidade, um tecido urbano invisível porém presente no dia a dia dos moradores locais.
Edmar Almeida
Artista convidado
Edmar Almeida é pós-graduado em processos artísticos pelo Unijales. Nasceu em Jales SP, morou em Vitória Brasil e hoje mora em Franco da Rocha na grande SP, é arte-educador desde 2012 e artista, pesquisador, xilogravurista e performer e relaciona o corpo e xilogravura como ato performativo. Participou de cinco importantes residências artísticas no Brasil e de três exposições individuais. Expôs na 1a e 2a Bienais Latinas da América da Gravura, e uma grande mostra de gravura na Argentina. Participou em 2018 de uma residência artística na FUNARTE SP e em 2019 do Projeto “Organicidades” via Proac Municípios em Franco da Rocha SP. Hoje participa como artista convidado da residência artística coletiva em residência Bauru, com projetos de Residência Artística na cidade de Bauru SP, contemplada via ProaC da Secretaria da Cultura do Estado e Economia Criativa de São Paulo. 2020 participou como artista convidado do 3º Festival Soy loco por ti Juquery e 2º Seminário Cultura e Saúde do Museu de Arte Osório Cesar em parceria com o Living Museum Society and Psychiatrie Sr. Gallen Nord. 2021 apresentou o projeto “Xilo Juca”, ocupando xilogravuras em larga escala em outdoors por Franco da Rocha, contemplado pela Lei Aldir Blanc do Município e uma exposição de arte imersiva “Estratigrafias do corpo” na programação do Festival Oxandonline.
“Caçamba” (2021)
Instalação (Objetos de caçamba ou descartados em terrenos e no curso no rio Bauru como amostras de água, madeiras, vidros, ferragens, plásticos e outros).
Dimensão: 3,70m x 1,10m x 70cm in
Caminhar e parar pela cidade de Bauru, me fizeram compreender e perceber a quantidade de caçambas que há pela cidade, estacionadas e navegando sobre um rio asfáltico. Esta investigação parte de um estado da água em conserva, água que se configura na ótica de parar o tempo, conservar aquilo que está em destilação.
Mapear caçambas me fez perceber a quantidade de madeiras e materiais que poderiam aderir ao processo, que possivelmente poderia atribuir materialmente a construção de um barco, este que não trafega mais sobre o rio Bauru.
A justaposição poética está no estado de uma caçamba, que trafega pela cidade, como um navio cargueiro, coletando lixo e sinais de mortes que vão parar no rio. As caçambas me fazem refletir os diálogos que a matéria narra de dentro para fora, o discurso está em um rio inavegável, que se coloca em prova como caçambas sobre rio asfáltico da cidade, analogias que partem em dois extremos, mas que se fundem em um único estado: a água.
A água tem convidado a captar diversas audiovisuais, já as caçambas materiais de descartes, a construção de um barco com esses materiais descartados é uma forma de abrir discursos, do quanto a cidade gera pela morte dela, do quanto estamos em estados de conservas, da sangria ao esgotamento, do descarte ao acúmulo, do movimento aí atropelamento, do navegável ao sucateamento.
As caçambas provam para nós uma espécie de urinol urbano, que mergulham no asfalto da cidade. Restos de madeiras encontradas nas caçambas serviram para construção do barco que foi todo trabalhado com materiais de descarte. Caçamba é uma analogia na busca de reflexão sobre o excesso de lixo produzido pela sociedade e o quanto de nós é visto poluindo diariamente o rio Bauru.
Dentro da caçamba é possível ver a quantidade de lixo sólido coletado durante esta investigação e um vídeo sobre a caminhada. O acúmulo é um estado de esgotamento, um olhar para fora, que relaciona ao meio urbano um objeto invisível em meio ao inefável mundo das formas, o barco é um gatilho, já os materiais a munição.
A instalação é um estado de deslocamento que aponta a barcaça para um significado cotidiano, a caçamba, que serve para sumir com o lixo, mas o lixo não desaparece, apenas muda de lugar ou estado que eu criei, o barco, fazendo refletir sobre a necessidade de descarte de resíduos mentais, que envolvem ideias e pensamentos inúteis para sociedade e para nós mesmos, colocando o material e a parte residual para um diálogo externo das fronteiras artísticas. O deslocamento dos materiais encontrados em caçambas, agora empregados no trabalho, simbolizam este desaparecimento perverso dos resíduos para lugares distantes e menos assistidos da sociedade, colocando em questão esse emaranhado acúmulo de frieza de nossas ações.
“Sangrias sobre Rio Bauru” (2020 / 2021)
Xilogravura impressa sobre papel
Dimensão: 33,5 cm x 33,5 cm in I 47cm x 47 cm x 3 cm
Série: 10 estampas emolduradas.
A série Sangrias vem propor uma discussão sobre o Rio Bauru e nela pude compreender o que de fato nesta residência me tocou a investigar. Ao chegar na cidade, o primeiro contato que tive foi com o Rio Bauru, que corta praticamente a cidade, numa situação que se assemelha ao Rio Tietê em SP. Sujeira, dejetos e poluição; um rio morto, que foi traído pela cidade que leva seu nome.
Jorge Lima, na Invenção de Orfeu, traz uma passagem do ato de navegar, ‘há sempre um copo de mar para um homem navegar’ que se assemelha ao ato de caminhar do pensador Francesco Careri. Como uma bússola que guia um navegante, pude ver uma reportagem de 2014 que traz o rio Bauru vermelho, fluxo de um acidente ambiental, sem procedência, um estado de sangria, que sangra sua morte, levando ao esgotamento pela sua situação. A bússola é uma fonte de direcionamento que leva ao desconhecido, utopias e distopias do elemento água que se encontra ao fluxo do rio.
O rio tem uma dimensão natural de tempo ou ao seu fluxo em sobrepor as escalas de tempos: geológico, natural e humano. A bússola é representada no formato circular do tempo, que recebe por sua vez a gravação hidrográfica do rio Bauru, dispostos em 5 matrizes precisas circulares. O estado central da água é percebido e cuidado no processo, em destilar graficamente sobreposições de tonalidades da cor ‘vermelha’ pulsante neste estado de esgotamento do rio.
Em um jogo visual, as matrizes são sobrepostas, buscando destilações gráficas da fluidez da própria hidrografia, um ritual preciso e imersivo dessas justaposições que se abre no processo venoso xilográfico. É um trabalho de olhar para dentro, abordando o curso contínuo de nossas veias, carregamos dentro de nós resquícios de rios, um entupimento pode acarretar sérios fatores desse fluxo. Os pontos cardeais são apresentados na quantidade de estampas, resumindo 16 provas únicas para série, buscando tonalidades diferentes e assemelhando ao processo, o direcionamento e a descoberta acionada pelas bússolas. Diante disso, esta série propõe uma abordagem da situação do rio, como pontos cardeais que desencadeiam outras séries em investigação na residência.
Marilia Vasconcellos
Artista convidada
Marilia Vasconcellos é artista plástica e site specific, fotógrafa profissional especializada em retrato e arquitetura. Sua carreira demonstra constante pesquisa, unindo livremente técnicas tradicionais à contemporâneas na criação de um processo experimental e híbrido. Mixa analógico e digital, escultura, botânica, desenho, som, vídeo e performance no seu desenvolvimento artístico e trabalho autoral.
Ganhou sete prêmios pela Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo, produziu e participou de residências artísticas e exposições nacionais e internacionais, expondo seus trabalhos em países da América do Sul e Europa: Argentina, Viena, Grécia, Portugal, Espanha, França e Itália. Formada em Fotografia pela Universidade Senac de Comunicação e Artes, atua profissionalmente desde 2002.
www.mariliavasconcellos.com.br
“Vazante” (2021)
(Almanaque histórico, alfinetes, linha de costura)
Dimensões: 110 x 40 cm
Picotado, o almanaque é o alicerce do tempo que vaza. Escorre em cadências multiformes e edifica montanhas, planícies e elevações geográficas. Fragmentos de notícias, antepassados e paisagens esquecidas são agora a massa corpórea da estrada de ferro. Vazante pontuada e costurada de Bauru a Bolívia.
Criada em um almanaque histórico da década de 60, encontrado em um sebo singular da cidade, Vazante evoca a importância da ferrovia Noroeste Paulista na criação de Bauru, usando sua história impressa como a matéria física da obra. Construída com fragmentos do próprio almanaque, reproduz de forma simbólica o relevo e o desenho da linha férrea Noroeste Paulista no percurso de Bauru à Bolívia.
“Botânica” (2021)
Folhas e plantas embalsamadas, tronco de madeira, sementes, desenho e xicara com café. Espécimes de plantas em cúpula de vidro com parafina em gel e sabão transparente, impressão fotográfica encáustica em parafina. Mesa antiga e cadeira da companhia ferroviária Noroeste do Brasil.
Dimensões: 120 x 50 x 76 cm
Longas caminhadas permeiam a percepção da flora, o fluxo da sua extensão urbana multifacetada e ao mesmo tempo constante, repetente. Caleidoscópio de espécies que transparecem o meu entorno e desvendam cantos remotos da cidade por onde passei em minha constante colheita.
Botânica é um trabalho perene e multiforme, um catálogo inventado, onde somo distintas partes de plantas para a criação de uma nova espécie. Para essa nova versão montei um cenário botânico, explorando diferentes técnicas de manuseio e preservação das plantas. Uma impressão encáustica em cera, desenhos, folhas e tesouros se unem a espécimes que flutuam dormentes em cristalina parafina. Espécies inventadas repousam fossilizadas em sabão transparente, desflorando a forma ao serem cortados em lâminas.
“Ladrilhar”(2021)
(Azulejos de argila porcelana sobre madeira de descarte)
Dimensões: 15 x 16 cm (cada peça)
Sobre a descartada madeira vivida e corroída pelo tempo, pontuo um pequeno mosaico de percepções plasmadas em barro branco. Pinçadas espontaneamente em um cotidiano observador e ouvinte, discorrem alegóricas em matéria plástica crua de fina porcelana.
A obra é um conjunto de pequenos azulejos que representam, individualmente, facetas da cidade de Bauru. Lábios leporinos, escorpiões, onças pardas dizimadas, queimadas, buracos, prostitutas e outros caminhos permeiam uma alegoria pujante extraída de conversas, vivências, histórias escutadas e apropriadas.
A cor branca sugere a interpretação de um objeto cru, latente e passível a intervenção. Ao mesmo tempo que também pode denotar uma ideia solidificada, escrava intacta de sua forma e não de suas nuances e personalidades multicoloridas.
“Periférica” (2021)
(Bastidores com bordados sobre tecido, intervenção em aquarela e QRCode)
Dimensões: três obras com 25cm de diâmetro (cada peça)
Coleciono não lugares, fendas expostas e ao mesmo tempo invisíveis, esquecidos por serem regidos como periféricos. Os exalto em fios de ouro e prata para assim descolar a sua natureza ausente, dando um novo lugar pulsante em minha releitura intrincada, minuciosa e viva. Crio uma obra projétil que enlaça a poética e a realidade.
Periférica foi construída após inúmeros “flaneurs” pelo google street view, onde virtualmente caminhei por lugares periféricos e esquecidos da cidade de Bauru. Com o intuito de trazer luz a tais ambientes, cada bordado carrega em si um QRcode, que após ser lido com o celular, leva à localização real de cada espaço escolhido, unindo realidades e emergindo essas paisagens imperceptíveis. Os bordados foram manufaturados em diferentes e intuitivas técnicas sobre tecidos “pobres” como pano de prato, pano de chão e flanela.
Aran Carriel
Artista convidado
Aran Carriel (1979) dedica-se à arte experimental na música, literatura, vídeo, ilustração e mais meios ao acaso. Em Bauru (1993) pariu o antigrupo AUTOBONECO+<, que centraliza sua produção audiotextovisual, lança discos e fez centenas de shows no Brasil, duas turnês na Argentina (2011/2014) e em cinco países da Europa (2018). Em 2011 co-produziu o média-metragem “Memória Nativa Terena” com jovens indígenas da aldeia Ekeruá (Avaí/SP); no mesmo ano, participou de mostra coletiva no Museu de Arte Moderna de Jataí (Goiás) com vídeo-instalação. Zineiro desde os 90s, lançou o livro “BRINQUEDO” (2014, ilustrado pelo próprio) sob edital literário (edição bilíngue na República Tcheca, 2018). Vive no mundo, reside e trabalha em Bauru, onde mantém o cinema livre CinExtinção (2011, curadoria & técnica).
https://autoboneco.bandcamp.com
(C)IDADE MÉDIA: EX-CULTURA/REVOLTA MEK^NIK^ (2021)
Álbum
Disponível em: https://autoboneco.bandcamp.com
A obra é o disco # 30 da AUTOBONECO+< (originalmente, antigrupo experimental além de “banda de garagem”, sob diferentes formatos e meios artísticos). Parte da permanência do autor na Bauru desde 1993, chegada à cidade e origem do antigrupo. O surgimento abrupto da pandemia inclinou drasticamente o teor do disco, sem imunidade a tudo isso. Seu processo foi de poucos temas/músickas prescritos e mais sob improvisação extrema audiotextovisual. Resulta no conteúdo multiforme proposto: álbum musickal conceitual; vídeos individuais para cada faixa; produção de textos, imagens e mini esculturas fotografadas para o material gráfico detalhado (uma página a cada músicka). A apresentação-lançamento na galeria traz o encarte “desmembrado”, com suas páginas abertas na parede formando o símbolo da AUTOBONECO+<. Ao lado, objetos originais que compõem as fotos do encarte e algo extra. Ao viés dessa âncora, Bauru é a (c)idade média.
Victor Harabura
Artista selecionado
Victor Harabura, nascido em 1987, vive e trabalha em São Paulo, Brasil, cidade onde nasceu. É pesquisador, artista plástico e historiador. O artista procura consolidar desejos e afecções temporais, transpor, por meio de suas criações, a potência dos espíritos de época em ato. Seus trabalhos buscam representar o ser humano, através de fragmentos, seja pedaços dos seus corpos ou objetos, que expressam a totalidade de seus movimentos e sentimentos, ou instantes de suas histórias. Foi selecionado no Programa de Estímulo à Cultura de Bauru, com a obra “Rasgo de Ferro” (2020), instalada permanentemente no Museu Ferroviário de Bauru.
“Kaingang” (2021)
Escultura (Cerâmica, madeira, aço e concreto)
Dimensões: 9 x 48 x 45cm
A minha ideia não era esculpir um rosto já conhecido ou um personagem que fosse icônico para os Kaingang, mas representar uma pessoa comum, alguém que passaria despercebido no meio da multidão. Busquei criar a escultura a partir de um homem idoso, cansado pelo tempo de trabalho nas plantações de mandioca da aldeia. Os traços de seu rosto são mestiços, uma combinação criada pela miscigenação.
Carrega consigo, junto ao ombro, sua companheira diária de trabalho pesado, gasta pelos golpes da sofrida vida. Sua camisa velha e surrada o ajudava a proteger-se do sol doloroso de Bauru. Todos os seus traços não o torna menos indígena, mas reforça a vida que leva afastado do dia-a-dia da cidade.
“Kaingangs”(2021)
Desenhos (Grafite sobre MDF)
Dimensões: 49 x 40 cm
Para a produção destas obras tive dificuldade em achar um suporte para os desenhos, não conseguia comprar materiais por conta da quarentena que vivemos por causa do Coronavírus. A alternativa foi utilizar pedaços de MDF que tinha em casa. A rigidez e principalmente a cor marrom do material me chamaram a atenção e vi potencial plástico para as minhas obras. Nos desenhos, segui o mesmo pensamento da escultura, mostrando os indígenas cotidianos inseridos em uma sociedade ocidentalizada, mas sem perder as tradições e características de suas identidades. Os desenhos completam a série que idealizei como proposta para as obras que representam Bauru para mim.
Felipe Cruz
Artista selecionado
Felipe Cruz, nascido em Bauru (1989) é formado em Geografia pela Unesp Ourinhos. Realiza pesquisas artísticas nas quais se utiliza de teorias do espaço geográfico para compreender as diversas nuances que a paisagem apresenta, através de uma filmadora digital captura cenas que retratam o cotidiano urbano e pela edição busca exprimir as emoções e sensações recordadas de cada lugar. Mantém o canal Pato VHS, onde costuma publicar algumas obras realizadas de forma experimental.
Youtube: https://www.youtube.com/channel/UC0EZrYA7ENade0DSS5UgtPg
Participar da residência realizada em Bauru foi vivenciar um momento onde o mundo estava prestes a entrar em estado pandêmico. Já se agonizava em suas contradições. O cotidiano é a experiência de vida e nela, as inúmeras percepções. A experiência me possibilitou focar minha energia vital para elaborar e desenvolver uma proposta que uniu o raciocínio geográfico com a elaboração de obras audiovisuais:
“Rolê de terça” (2020)
Videoarte / Duração: 11’47”
Trilha sonora de Ricardo Cezario.
Tentativa de sentir o calor do corpo na cidade de Bauru em uma terça-feira. Feições nada novas da rotina: o urbano.
“Centro” (2020)
Videoarte /Duração: 6’20”
Meia noite no Centro de Bauru, uma cidade livro que conta sempre a mesma história do desenvolvimento: Novo velho e apagado.
“Feira-do-Rolo” (2020)
Videoarte/ Duração:16’05”
Trilha sonora de Ricardo Cezario.
Domingo saí com o Farlei às 3:40 da manhã, do Geisel para a Feira do Rolo. Em seu estacionamento ficamos e conversamos com várias pessoas que ali estacionavam os veículos, em sua maioria os próprios feirantes que fazem a feira de domingo. Conversas sempre com risos que terminavam sempre no desejo e esperança de uma boa feira em meio da uma atmosfera de incerteza econômica. Não me demorei muito no estacionamento, fui presenciar a transformação dos dias, a rua e suas imagens e sons em transformação.
“Cidade tentativa lúdica” (2020)
Videoarte / Duração: 4’54”
Trilha sonora de Ricardo Cezario.
Interpretação: Camila Araújo.
Interpretação quase guiada na cidade, um sonho acordado: romper as barreiras invisíveis no tato urbano, texturas, paredes, chão: onde está o lúdico? o que é para ser feito e como existir na cidade.
“Caminhos do CEU” (2020)
Videoarte / Duração: 5’05”
Idas e idas durante um mês para um mesmo lugar, o ateliê da residência em Bauru, na Estação Cidadania – Cultura – CEU Bauru. O caminho se tornou a própria extensão entre casa e ateliê. Essa é minha experiência atmosférica durante esse período.
Julia Nogueira
Artista selecionada
Julia Nogueira é paulistana, nascida em 1997; formada em Design Gráfico e atualmente cursando Bacharelado em Artes Visuais na UNESP – Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” no campus de Bauru. Em seus trabalhos investiga relações entre forma e conteúdo, partindo da linguagem visual para construir obras que reúnam em si uma pluralidade de texturas e volumes, com o uso de materiais encontrados nas ruas; tem como interesse a pintura, escultura e instalação. Participou de exposições coletivas na Galeria da FAAC (2018) e nos Jardins da Pinacoteca Municipal de Bauru (2019); atuou como monitora de apoio técnico nos ateliês de Artes da UNESP – Bauru (2019) e foi artista residente do Projeto “Em Residência Bauru” – Produção de Exposições Inéditas de Artes Visuais contemplado pelo Edital PROAC nº 10/2019.
“Instabilidades Cotidianas” (2020)
Arame, madeira, madeirite resinado, papelão e tela de arame galvanizado)
Dimensões: 2,03 m x 1,95 m x 3,10 m
A obra Instabilidades Cotidianas é composta de duas peças que dialogam entre si, evidenciando contraste de formas e texturas. A primeira é uma parede que se inclina desafiando sua própria rigidez formada por diversos fragmentos de madeira e papelão; e a segunda peça, que vai de encontro à primeira, é formada por grades de metal e arame enferrujado. Os materiais utilizados foram encontrados em caçambas e canteiros de obra pelos quais passei em diversos bairros da cidade durante a residência, e foram incorporados com suas marcas de uso e deterioração.
Tive como eixo norteador o conceito de “construção” – social e material – dentro do contexto urbano de Bauru, propondo reflexão sobre a ressignificação dos resíduos do consumo e da construção civil por diversas classes sociais, que aponta para uma estrutura de desconstrução/construção urbana e para questões como o acesso à cidade, moradia e transporte, intrinsecamente ligadas ao cotidiano bauruense. A composição apresenta uma estética do inacabado, constituindo um corpo cheio de retalhos que nasce a partir da cidade e cria novas relações espaciais com o entorno e suas adversidades.
Filipe Lea Plaza
Artista selecionado
Filipe Lea Plaza (1996) é artista, fotógrafo e arte educador em formação. Natural de Bauru-SP, cursa atualmente o quarto ano de Licenciatura em Artes Visuais na UNESP-BAURU. Seu trabalho reside no hibridismo entre a fotografia ensaiada e a fotografia documental. Retratista, busca sempre criar universos e contar histórias através da fotografia, com referências dentro e fora da história da arte. Na universidade, foi bolsista assistente do ateliê de Artes Visuais da UNESP/BAURU e é monitor bolsista do Polo Arte na Escola pelo segundo ano consecutivo. Atualmente sua pesquisa engloba tanto a fotografia quanto o conceito de Professor/Artista, e através da arte, história da arte e pesquisando outros professores artistas, cria paralelos e busca quebrar as barreiras entre o ensino e a produção artística, entre sala de aula e ateliê.
“Santa Joyce” (2020)
Fotografia
Dimensões: 70 cm X 50 cm
Modelo: Joyce Rodrigues
Maquiador: Luigi Rigoni
A primeira pessoa que aceitou participar do projeto foi a Joyce, nascida, criada e moradora de Bauru. Em nossas conversas, Joyce, que é umbandista, contou sobre o preconceito sofrido por conta de sua religião. A partir daí, juntos, decidimos tornar esse um dos elementos centrais da composição. Juntamos referências e pensamos em locações para o desenvolvimento da obra.
Ficou decidido que a foto seria feita em frente ao terreiro em que Joyce trabalha como instrumentista, o Terreiro Caboclo do Sol e da Lua, localizado na região central da cidade, próximo a linha de ferro. O espaço, por si só, trazia elementos inebriantes capazes de nos transportar para um ambiente de fantasia. Em seus pés colocamos um padê (oferenda) de Oxóssi, Orixá sintetizado como São Sebastião na Umbanda. Oxóssi é o Orixá guerreiro das matas, o caçador. Ele anda com sua flecha e come frutas como melão, uva e coco. Com a imagem tentei chegar nesse panteão africano, nesse lugar divino onde reside os orixás. Trazer essa parte tão genuinamente brasileira ao projeto agregou muito esteticamente e referencialmente os estudos a respeito de São Sebastião.
“Santa Agnes” (2020)
Fotografia
Dimensões: 70 cm X 50 cm
Modelo: Santina Agnes
Maquiador: Luigi Rigoni
A obra conta com a participação de Santina Agnes, uma mulher trans/travesti da cidade de Bauru, sempre se faz presente nos locais de militância da cidade. Na época, Agnes e seus sócios comandavam a Fumacê, um bar e centro cultural, conhecido por acolher as comunidades negra e LGBTQ+ da cidade.
A potência do espaço e da figura de Santina não podiam ser desperdiçados, desse modo, ficou decidido que a fotografia seria produzida na Fumacê. O que tornou a imagem ainda mais potente foi a ideia de encenar-lá na durante um dos eventos do bar.
Acompanhar a reação das pessoas com a produção foi incrível. Todos olharam com curiosidade, interagiam com a modelo e com com o fotógrafo, organicamente. O que tornou a experiência ainda mais rica. Foi um ato performático que resultou em uma linda fotografia. Mais uma vez fiquei totalmente feliz com o resultado e com o processo, que se mostrou tão potente quanto a fotografia final.
A obra produzida nos mostra Santina em seu lugar de luta, residência. As mãos da modelo, postas em formato de uma mão chifrada, foram um presente inesperado, um ato que não estava programado por mim, feito espontaneamente por ela. Um ato que evidencia o carácter de todas as obras e onde eu por todo momento tentei residir: no híbrido entre a fotografia documental e a fotografia ensaiada. Esse lugar reside entre o sonho e o real.
“São Deni” (2020)
Fotografia
Dimensões: 70 cm X 50 cm
Modelo: Deni
Maquiador: Luigi Rigoni
A última produção da série estava a caminho, e dessa vez, o modelo seria o Deni. Logo em nossas primeiras trocas, o jovem de 19 anos contou um pouco sobre sua trajetória. Deni, como prefere ser chamado, saiu de casa ainda muito novo, com 15 anos, por conta de conflitos familiares. A partir daí deu início a caminhada que culminaria na abertura de seu salão, o Víbora Negra, especializado em tranças. Dada a importância deste para o personagem, e para a própria comunidade, batemos o martelo: seria alí a locação.
A partir daí abandonamos a ideia inicial, que era fotografar Deni no coreto da praça Ruy Barbosa. Ao mesmo tempo em que esta carrega grandes significados ao público bauruense, sendo um marco da cidade, o salão de Deni, para ele, possuía uma apelo afetivo muito maior. O que não deveria ser descartado, pelo contrário.
A caracterização se deu e os primeiros cliques foram sendo feitos. Elementos do próprio espaço foram realocados, até atingir o resultado desejado. O verde das folhagens, em oposição ao roxo vibrante das paredes, faz a fotografia saltar aos olhos. Em consonância com os elementos típicos da iconografia de São Sebastião, temos uma imagem delicada e, ao mesmo tempo, cheia de força e significados.
Intitulada “São Deni”, a obra representa um jovem em seu local de trabalho, onde transitam pessoas queridas, compartilham-se momentos alegres, onde vivem sonhos. Pude experimentar essa alegria contagiante do ambiente. Sempre cheio de pessoas e histórias, o salão Víbora Negras x Pikumanas promove cultura, estética e vivências de sujeitos pretos e LGBTQ+ da cidade de Bauru.
Jeff Barbato
Artista selecionado
Jeff Barbato (1990) vive e trabalha entre Sorocaba e Bauru. Bacharel em Artes Visuais pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Sua relação com arte é quase instintiva e começou na própria infância. Jeff propõe diálogos entre os lugares em que a fissura aparece e os fragmentos, acontecimentos e desdobramentos dessa insurgência, passando por searas como corpo, sexualidade e territórios urbanos. Com olhar sensível para o chão e para tudo aquilo que é esquecido e deixado à mercê de si mesmo, sua pesquisa transita por multilinguagens, partindo do desenho e da fotografia. Em 2020 recebeu o prêmio FUNARTE Respirarte e também o prêmio incentivo do 17° território da arte de Araraquara. Participou de exposições coletivas em cidades do Interior Paulista e foi selecionado para o programa de acompanhamento Meios e Processos da Fábrica de Artes Marcos Amaro em Itu.
“Cidade transitória” (2020-21)
Instalação sonora (Folhagem, terra, serragem, porcelana, laca, folhas de ouro, falantes, amplificador e aparador)
Dimensões: 120 x 240 x 120 cm.
A Faculdade de Odontologia de Bauru, da Universidade de São Paulo (FOB-USP), realiza dentro do município a pesquisa e o trabalho epidemiológico científico que é referência internacional até os dias de hoje, ao se falar da incidência de fissuras labiopalatinas na população brasileira. Essas infindáveis pesquisas científicas trouxeram e ainda trazem para Bauru pessoas de todo território nacional em busca de tratamento para sua fissura e demais anomalias craniofaciais dentro do Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais (HRAC/Centrinho). Dom Eliseu (PA), Formosa (GO), Porto Alegre (RS), Ipanema (AL), Belo Horizonte (MG), Vila Velha (ES), ABC, São Paulo e Bauru (SP), pessoas com um mesmo propósito, um mesmo destino: Centrinho em Bauru. Xs entrevistadxs interessadxs em participar do projeto, preencheram o formulário de manifestação voluntária divulgado nas mídias sociais, a partir disso, as entrevistas foram realizadas por ligações telefônicas.
Na instalação Cidade Transitória são reproduzidos em minha própria voz trechos das entrevistas feitas com 10 pacientes/acompanhantes frequentadores do Hospital de Reabilitação de anomalias Crânio-faciais, bem como palavras repetidas com frequência pelxs entrevistadxs. Sobre a mesa há peças de porcelana quebradas e remendadas com ouro, encontradas na rua. Também utilizo folhagens, areia da praça e a serragem, para desenhar o mapa dos percursos feitos pelxs entrevistadxs dentro da cidade de Bauru de acordo com seus relatos sobre lugares de memória, sugerindo Bauru como uma cidade de passagens.
“Tantos chãos inconformados” (2020-21)
Instalação com 28 frotagens de fissuras no chão da cidade de Bauru (Atadura gessada, medidas variadas)
Tantos Chãos Inconformados trata-se de uma série iniciada na fotografia, mas que para a residência foi pensada e realizada em outra linguagem. Para desenvolvimento da obra revisito locais em Bauru, fruto das memórias pessoais minhas e das pessoas entrevistadas. No processo de pesquisa pedi para que descrevessem um local da cidade de Bauru sem me dizer que local era esse. Ao todo identifiquei sete lugares.
Dentre os lugares, estão: Faculdade de Odontologia de Bauru (FOB-USP) e o HRAC/Centrinho; o parque Vitória Régia que fora citado por todas entrevistadas visto sua proximidade com o prédio do Centrinho; o Centro da Cidade; o Bosque da Comunidade; a região do Bauru Shopping e também o Templo Tenrikyo, que apesar de distante do HRAC, também fora citado por algumxs entrevistadxs. Estive em todos os locais procurando por rachaduras no chão, a fim de fazer frotagens com atadura gessada materializando essas rachaduras no corpo do trabalho e assim transportar para dentro da galeria memórias de cada lugar.
“Útero” (2020)
Dimensões: tríptico, 79x73x9 cm (Três caixas de madeira, tecido voil, linha, papel e aquarela)
Atravessado pela pandemia de COVID-19, Útero nasce durante a residência e transforma-se quando já isolado em casa por conta da pandemia. O trabalho consiste em três caixas de madeira confeccionadas por meu pai e sobrepostas por retalhos de tecido voil de minha mãe. Em duas caixas bordei sobre o voil com linha preta, semelhante à utilizada para suturar ferimentos, o trajeto feito das respectivas cidades/estados das entrevistadas até Bauru.
Utilizei como referência um mapa do Brasil em escala de 1cm:50km visto que foram entrevistadas pessoas de diversos estados brasileiros, do norte ao sul do Brasil. Na terceira caixa o bordado sobre o voil simula o trajeto realizado pelas entrevistadas entre os locais de memória dentro da cidade de Bauru, tendo o Centrinho como ponto comum. No interior das três caixas, como em um útero, guarda-se um tesouro, ilustrações feitas com aquarela de três pacientes dos dez entrevistados, todos baseados em fotografias do momento antes dos pacientes fazerem a primeira cirurgia de reparação de sua fissura labiopalatina.
Por fim, minha proposta no projeto foi passar semanas imersivas recolhendo material historiográfico sobre pessoas que se deslocaram até Bauru em busca de tratamento para sua fissura, visto que o Centrinho é referência na América Latina no tratamento da fissura labiopalatina. A partir disso, arrisco dizer que o guarda-chuva que cobre todo esse percurso caminha por lugares da humanização, do afeto, da valorização da vida e do amor materno. E digo por fim com satisfação de que se essas narrativas não fossem fissuradas essas histórias não estariam sendo contadas.